Texto: Helena Novais
Em 11.02.2012
Comecei a trabalhar aos quatorze anos. E quando muito jovem acreditava que o sucesso profissional estava garantido aos mais dedicados às suas funções, àqueles que as exercessem com mais eficiência e eficácia, aos mais dispostos a aprender e a se aperfeiçoar sempre. É isso o que prega o discurso ainda vigente, não? Trabalhei muito, me dediquei demais, até chegar a não ter férias ou finais de semana. Mas, um dia caiu a ficha e me dei conta de que as coisas não são tão simples quanto prega o discurso.
Em 11.02.2012
Comecei a trabalhar aos quatorze anos. E quando muito jovem acreditava que o sucesso profissional estava garantido aos mais dedicados às suas funções, àqueles que as exercessem com mais eficiência e eficácia, aos mais dispostos a aprender e a se aperfeiçoar sempre. É isso o que prega o discurso ainda vigente, não? Trabalhei muito, me dediquei demais, até chegar a não ter férias ou finais de semana. Mas, um dia caiu a ficha e me dei conta de que as coisas não são tão simples quanto prega o discurso.
As melhores oportunidades, na verdade, estão reservadas aos mais “adequados”. Isso significa aos mais aptos a fazer o jogo das conveniências, das aparências, muitas vezes de forma nada ética; àqueles que escolhem as melhores máscaras para cada situação; aos mais hábeis em suprir as próprias necessidades às custas de outros e em administrar os seus “contatos”. E quanto mais sutil e disposto a ser usado e a usar, maiores as chances. O que predomina nos ambientes de trabalho (e não apenas neles) é a luta de todos contra todos, a sobrevivência a qualquer custo, mas de forma camuflada.
Ser competitivo significa ser competitivo para ganhar do outro, não para ganhar para todos. Essa visão, no âmbito das burocracias, prejudica, inclusive, a própria transformação do sistema capitalista que não é mau por si, se faz mau pelas ações das pessoas que nele atuam, principalmente nas hierarquias mais altas. Quanto não é alterado no interior do próprio sistema pela ação daqueles que querem manter os próprios privilégios? Se inutilizada, cada vez mais, o sentido de fraternidade. E assim, sob a capa de “civilização”, se promove o cultivo da sordidez.
A lei da selva vigente nos ambientes de trabalho, é a lei da selva que se está a aplicar na vida em sociedade e é com esta perspectiva que uma parte considerável da opinião pública está a interpretar as leis do Estado. Foi com esta perspectiva que se manifestaram certos moradores dessa cidade cosmopolita – muito “bem instruídos” que foram por uma educação pragmática, funcionalista –, diante dos atos selvagens com que foram tratadas as famílias do Pinheirinho.
Famílias foram desabrigadas sob violência física e psicológica. Idosos, crianças, mães desesperadas. Isso com o apoio do Estado e da lei, sob a desculpa de reintegração de posse (estariam em área invadida cujo dono reclamava restituição). E eu vejo gente culpando as próprias famílias pela violência, afinal, elas seriam “preguiçosas” que não vão trabalhar para ter melhores condições de vida e não precisar do auxílio aluguel a ser pago pelo Estado!
Por este tipo de julgamento se denuncia a falta de visão de contexto histórico, de relações de causas e efeito, de noção de estrutura. Ora, qual o processo histórico que fez com que estas pessoas viessem a precisar de auxílio? Qual o contexto político e social atual? Qual o processo, inclusive de formação dessa visão das coisas? Nós vivemos no país dos coronéis que se transformou no país do mensalão e que agora foi coroado como o país do Pinheirinho... A barbárie institucionalizou-se e agora é apoiada pela lei e encontra respaldo na alienação de muitos!
Que tristeza! E que vergonha para um país que se quer “desenvolvido”! Aqui, além da desinformação, aparece desvinculada da noção de progresso material a noção de humanidade e de empatia diante do sofrimento alheio. O outro é visto como o inimigo a ser desalojado e ter sua vida violada. Não como alguém que encontrou portas fechas até muito antes de nascer.
O Brasil tem uma história conhecida de corrupção que já é mais do que o suficiente para que se desconfie da adequação das próprias leis estatais à realidade social e às necessidades do povo. Não seria o tráfego de influências em congresso e câmaras, os lobbies, os conchavos, indícios de um sistema estatal podre? Claro! Então, como usar a lei para explicar o ocorrido no Pinheirinho? Não é o caso de se repensar uma lei que beneficia um e outro em prejuízo de uma maioria em situação de risco? Que país é esse que usa a lei para justificar a agressão ao povo?
É o país dos lobbistas que corrompem a tudo e a todos; do discurso corporativo e midiático ideológico e doutrinário do qual se beneficia gente que extrai do povo até o direito ao livre pensamento, impossibilitando a crítica construtiva e entorpecendo a todos pela alienação, mas que não deixa de passar férias na Europa, em Dubai, nos mais luxuosos centros turísticos. Afinal, é preciso comemoram o sucesso! E são “bem-sucedidos”, mesmo, pois a alienação, que eles desejam sedimentar definitivamente, só avança.
A história é testemunha de que não são os pobres e miseráveis que orquestram as maiores catástrofes sociais. São sempre as “elites letradas”. Hitler usou o a estética, a ética, o direito distorcidos para formatar um Estado e uma realidade social que culminaram com a “limpeza étnica”. Foi colocado no poder pela própria população e, apoiado pelas elites, moldou a lei e o Estado como quis. E deu no que deu... Pinheirinho! E assim caminha a humanidade.