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Mensagem na Garrafa – Ano 0, Número 1









Tudo o que eu mais quis foi ser uma pessoa comum com uma vida comum. Quando criança, quis uma família padrão; quis ser popular na escola, como as outras crianças. Mais tarde, quis continuar os estudos e ter a vida de uma adolescente comum, com amigos, namoradinhos, festinhas, passeios e viagens comuns. Mas, nunca me senti bem em festas, jamais me ajustei aos jogos sociais. Quando adulta, quis um trabalho normal com salário normal, com rotina normal e relacionamentos comuns. Mas, as coisas nunca acontecem comigo como acontecem com todo mundo, comumente. E Deus sabe o quanto eu tentei ser apenas comum. 





Qualquer pessoa comum, talvez um tantinho alienada, parece mais feliz do que quem anda escavando a essência de todas as coisas. Quem me dera ter o dom de me acomodar às superfícies, sem me perguntar pelas causa, pelas estruturas, pelos efeitos, pelas condições, possibilidades e combinações! 





Minha última tentativa de ser comum teve o peso de uma sentença de morte. Aquele ser que sempre almejou a estabilidade de uma vida comum morreu e passou um bom tempo no purgatório das almas. E renasceu, consternada. Porém, mantenho minha falha essencial, admito: excesso de sensibilidade. O que me sensibiliza adquire o poder de me atingir com a intensidade de uma bomba atômica, atirando-me ao canto de salas escuras onde agonizo lentamente até mais uma morte. Entre escombros, renasço mais forte é bem verdade, mas nunca mais forte do que minha própria sensibilidade.

Quero a força dos que não se importam... Mas, também ela é comum. Não é para mim. O que tenho feito, cada vez mais, é me afastar, dar as costas e seguir adiante racionalmente enquanto uma vozinha me persegue. Furiosamente ordeno que se cale. Chega de vozes! Elas também são comuns, então que também não sejam para mim... O importar-se, cada vez mais, projeta-se para o interior. Perdi a fé em soluções exteriores e coletivas. 





Enquanto a gente insiste em ser o que não é, não é plenamente o que realmente é e nem o que deseja ser. No máximo permanece, está, como algo que não é nada por não aceitar ser o que é.  



É preciso muita coragem para ser o que se é... Significa enfrentar racionalmente o que nos contraria, moldar-se para tirar o melhor de contrariedades indesejáveis a ponto de que elas se tornem o alicerce da nossa existência. Mas, quem não precisa de um porto para descansar e um igual que nos sinta compartilhadamente?  



Em 2014 eu voltei para mim. Mas, outra. Ainda não sei como se descansa sob a tempestade. E nem tenho muitas esperanças de no temporal encontrar felicidade. Talvez simplesmente a paz seja tudo o que se possa almejar... E isso já é uma grande coisa! 





(hn)