Meu primeiro impulso para discussões virtuais, hoje e cada vez mais frequentemente, é de dar as costas e sair andando a esmo... São sempre os mesmos discursos viciados e na cultura/sociedade nada nunca realmente muda para além das superfícies - só as vestimentas mudam, as aparências, as camuflagens... Energias assumem sempre as mesmas configurações, e meu sentimento é de cansaço vizinho à necessidade de autopreservação. Então, saio, vou embora. Caminho aos tateios, em busca...
São essas as minhas impressões e como me sinto observando as discussões que acontecem no espaço digital, e até no concreto muitas vezes... É isso o que me veio em um 2023 marcado por tantos conflitos que ainda são os mesmos.
Na Antiguidade guerreiros armados de escudos, lanças e flechas invadiam territórios a pé, depois à cavalo, depois em carros motorizados e com suas armas tecnologicamente desenvolvidas... Matavam, pilhavam, estupravam, destruíam... Hoje exatamente o mesmo acontece e com a mesma selvageria, com a mesma crueldade bestial.
É incômodo pensar que cheguei na minha quinta década de vida sendo ingênua, mas foi isso... Eu acreditava que a humanidade aprendia com seus erros, pois havia uma disposição geral nesse sentido. Eu acreditava que o mal extremo que eu não causaria era equivalente ao mal que outros não causariam... Eu não me conhecia e nem aos outros... E aí vi pessoas se desrespeitando e se agredindo a um nível primário, e aprendi que posso fazer isso também em situações extremas... E vi povos que passaram por genocídio exercitando atos de extrema crueldade contra outros povos inocentes... A Ucrânia foi vítima do holodomor, mas isso não impede a Rússia de, novamente, fustigar os ucranianos. Os judeus foram vítimas do genocídio nazista, o que não impede Israel de trucidas os civis palestinos inocentes, crianças, idosos, mulheres... Militares brasileiros estiveram no Haiti, o que não impediu vários deles de apoiar um golpe militar que imporia aquele modelo trágico de existência para os brasileiros... O que mudou? O que foi aprendido com antigas tragédias?
Em discussões, ainda hoje, é preciso insistir em defender princípios elementares - como coerência e direito à vida - contra aqueles que ignoram os livros de História e não se importam em evoluir... Não cessa o conflito entre o "ter" e o "ser" entre aqueles que se recusam a raciocinar sobre os limites de ambos os conceitos.
A verdade é que ninguém tem nada, além do momento, e nem sobre ele se tem qualquer controle... A humanidade sofre da doença da falta de consciência de si, de uma indisposição generalizada para pensar sobre conceitos e nos próprios limites, de narcisismo puro e simples... Kant tinha razão, a humanidade permanece na menoridade por preguiça de pensar... O que mais se vê nas redes sociais hoje são ignorantes falando do que não sabem, prepotentes se acreditando superiores e invencíveis, narcisistas se achando o próprio vetor de mudança do mundo... A humanidade sofre de soberba e cegueira, além de ganância... Passamos por uma pandemia ontem que esfregou em nossos rostos o quanto somos frágeis e insignificantes na ordem cosmológica. E o que mudou, realmente? Estamos em meio a uma crise climática óbvia. E o que muda, realmente, nos comportamentos em geral e nas ações políticas em especial?
Apesar disso, se coletivamente e historicamente nada muda a fundo, é preciso questionar se isso acontece devido a limites da natureza - entendida como conjunto de dinâmicas de configurações de energias -, ou se é o ser humano que não consegue ultrapassar alguma etapa crucial por se recusar a sair da caverna e a conhecer a si mesmo... Seja como for, também é preciso, sim, insistir no esforço por viver em paz no próprio micromundo, pois essa é a condição básica de manutenção de saúde do corpo e da mente... Porém, alguns vivem em paz em suas áreas de conforto e alienadamente, enquanto outros encontram conforto na transgressão...
E, talvez, essa (a transgressão dos que realmente se sentem confortáveis realmente transgredindo), seja a única saída possível... Tenho (e temos) todos os sentimentos possíveis dentro do universo de concepções formado e mantido por um corpo humano e o anseio pelo novo, o que significa que tenho (e temos) o potencial de transformação como propriedade inerente... Continuo amando os outsiders, quero e me esforço para ser um deles. Poucos, raros...
E tenho me voltado para os alienígenas. Minha consciência me diz que os alienígenas estão aqui... Estou cercada e habitada por eles neste mesmo planeta... É uma outra concepção de "alienígena"... Me refiro a tipos específicos de alienígenas, ou "aqueles que estão além do meu corpo, embora no mesmo planeta, e, também, aqueles que estão no meu corpo como vida que o habita..." Como uma bactéria, um vírus, um inseto percebem o mundo? Seria correto classificá-los como seres não-sencientes? Não se trata de negar ou afirmar, mas de expandir conceitos... O que eu tenho para aprender com eles, os alienígenas terráqueos? E com outros grupos humanos, outras raças, outras culturas, outras línguas, para além do eurocentrismo?
Esfandiary, o pensador transumanista, escreveu que a humanidade aprenderia muitíssimo com os extraterrestres quando os encontrasse, que ultrapassaríamos barreira colocadas ao conhecimento... Esfandiary deixou de considerar que sabemos pouco, muito pouco, sobre aqueles que habitam este nosso planeta Terra. Nosso problema não é conquistar outros planetas. Temos desafios o suficiente por aqui mesmo... Me sinto ignorante sobre povos que habitam este mesmo país, o Brasil... Há quase duas centenas de dialetos falados por povos originários presentes no território brasileiro e desconhecidos até pelos próprios brasileiros!
Enfim, 2023 foi o ano que me colocou de frente, sem chance de negação, com outras possibilidades de pensar o mundo, modos que estiveram presentes o tempo todo e eu não percebia porque a cegueira é o estado humano originário e é tão difícil afastar-se dela... Foi o ano que colocou em aberto a questão: há possibilidades REAIS - e não apenas superficiais - de transformação ao ultrapassarmos antigos modos de pensar?