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2023, Capítulo III

E com a visão comprometida, como ficam meus planos editoriais? Bem, não me vejo aceitando trabalho como diagramadora e revisora por hora. Em encadernação penso como um passatempo com potencial terapêutico... Não sei como aconteceu, mas hoje sinto que tenho opções. Se não vou escrever e preparar publicações, posso divulgar conteúdos de outras tantas formas... 

No último ano vários nomes ganharam espaço na minha vida! Eles estão contribuindo para que eu feche toda uma trajetória de estudos sem a antiga impressão de que estou me movendo entre fragmentos desconexos... Enfim, montei o quebra-cabeças da minha vida! Sem pontas soltas...

Descobri Mark Fisher, o filósofo inglês, e me identifiquei totalmente... Identificação que me encanta porque acende várias luzinhas na minha mente! Fisher nasceu no mesmo ano que eu, 68. Ele escreveu seus textos com um forte lastro em suas próprias experiências pessoais, claramente e assumidamente. A novidade é que vivemos num mesmo tempo, contemporaneamente... Falando de cinema ele se refere a filmes que eu mesmo vi e na mesma época que ele. Falando sobre música ele se refere a um contexto cultural que eu também vivi, nos anos 80 e 90... Quando Fisher fala sobre política, capitalismo e Margaret Tatcher, retiro do baú minhas próprias lembrança, impressões, meus sentimentos. Ler Fisher é como conversar como um velho amigo com quem tenho muito em comum e que me dá ótimos insights sobre o que eu mesma possa fazer... Fisher me ajuda a superar a minha própria insegurança, o meu próprio "complexo de impostora". Preciso disso! Preciso acreditar em mim, no meu próprio valor! Estranhamente não sinto a mesma identificação com Zizek. Talvez porque seus texto me soam "empolados", não acontecendo o mesmo com o material de Fisher que escreve de maneira mais clara e objetiva. Simples sem ser simplista... Fisher me diz que não é tolice escrever sobre o que eu quero, como eu quero, sem medo de mandar o academicismo para o espaço e de soar superficial ou popularesca para os acadêmicos. A questão é que a profundidade só se revela sob certas condições - para além de preconceitos de qualquer tipo - e não para todos, independentemente de como se escreve ou sobre qual assunto... 

Jacques Derrida é outro nome que marcou meu 2023... Tropecei nele quando eu pesquisava sobre críticas ao transumanismo, por volta de 2019. Derrida foi e é um grande impulsionador da crítica ao logocentrismo europeu e das filosofias decoloniais. Um nietzschiano que refletiu sobre questões de Linguagem, entre outras coisas, claro... Sua "Gramatologia" se tornou meu livro de cabeceira, e também por influência de Gayatri Spivak, a pensadora indiana... 

Spivak é outro nome que aportou na minha vida trazendo novas perspectivas. Responsável pela primeira tradução da "Gramatologia" para o inglês, ela se dedica à crítica literária e, também à filosofia feminista e decolonial. Escreveu "Pode o Subalterno Falar?"... As mulheres vêm ganhando espaço na minha vida, e muito por influência da Marília Pisani, minha antiga professora, com quem voltei a estudar no começo do ano que se findou... Marília foi quem me apresentou Donna Haraway, e sua proposta de espécies companheiras, me indicou textos, me desafiou a pensar por esse caminho... Karen Barad também foi um nome que surgiu por indicação da Marília. Barad escreveu "Meeting The Universe Halfway", o livro que eu gostaria de ter escrito... Física quântica e ética! O livro que talvez Nietzsche gostaria de ter escrito depois dos estudos sobre Física que, infelizmente, ele não pôde fazer... 

E sinto que sou muito leal aos fundamentos básicos da minha formação. Freud é outro que nunca saiu do meu horizonte. Quanto à psicanálise, sinto que entrei em uma nova fase impulsionada por Deleuze, Guattari e o "Anti-Édipo", livro que inspirou todo o movimento aceleracionista e que eu percebo como uma obra-de arte... Trata-se, a meu ver, mais de criar novos pontos de vista e novas possibilidades e formas de expressar-se filosoficamente do que propriamente de estar certo ou errado...  Também sinto o dedo do Nietzsche aí, talvez mais na forma do que no conteúdo... 

David Kopenawa com seu "A Queda do Céu" é estupendo! Apaixonante! E também enlaçou os meus estudos, juntando fragmentos em um todo maior... Mas, meu carinho maior vai para a Eliane Brum, a jornalista que escreveu "Banzeiro Ókotó", sobre a Amazônia,  e "Brasil Construtor de Ruínas", entre outros... Brum é mais do que que uma jornalistas. É admiradora declarada do trabalho de Donna Haraway e uma filósofa da práxis... Corajosa, desafiadora, gigantesca, inspiradora... A fundadora do site Sumauma.

Eu poderia escrever livros sobre cada uma dessas pessoas, seus textos e como esses escritos se casam perfeitamente com o que eu mesma venho intuindo e lapidando intuitivamente ao longo dos anos...  Aqui deixo apenas mencionado que foi importantíssimo estar em sintonia com tais pensamentos em 2023! Me tirou do limbo, me deu forças quando elas ameaçaram faltar... Se por um lado um mundo deixou de fazer sentido, vislumbrei outros universos possíveis, pelo menos mentalmente... E, por isso mesmo, me distanciei bastante das redes sociais... Não sinto mais que elas são parte da minha vida. Abriu-se um distanciamento, passei a erguer muros. Penso nelas hoje apenas como janelas por onde posso espiar as reações alheias vez ou outra. São suportes possíveis para materiais que eu posso criar, claro! Mas não tenho e nunca tive pretensões de entrar na disputa por visibilidade, comentários, likes e a neurose expositiva e narcisista toda... Incrível que tanta gente não se dê conta das próprias ações narcisistas!