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As Linhas Tortas








Em janeiro a Maia completou um ano. Em março fez um ano que ela está em casa. Minha mãe diz que desde que ela chegou todos os dias são como se fossem o primeiro dia dela aqui. Verdade! Paparicada, mimada, o centro das atenções, ela é sensível, alegre, doce, curiosa, ansiosa e meio desastrada. A minha “menininha”! Normalmente... 





Ela, como todo filhote, tem a mania de morder e estraçalhar todas as coisas só para espalhar os pedaços pela casa. Dias atrás estava em vias de destruir mais um chinelo e minha mãe foi salvá-lo. A Maia travou os dentes no calçado e não havia quem o tirasse dela. Minha mãe pegou outro sapato, levantou ameaçadora com ares de “ou você solta ou apanha”. Pra quê? A pequenina perdeu as estribeiras, mostrou os caninos já bem crescidos e em fúria avançou contra a D. Maria. Isso nunca tinha acontecido de tal forma e nos assustou a ferocidade da “meninha”. Ao sentir-se ameaçada ela se defendeu instintivamente. Curioso é que ela nunca levou um tapa muito menos uma sapatada.





Nesta bichinha adorada acomodam-se a docilidade e a fúria descontrolada. Os seres humanos também são assim. Todo mundo tem seu limite. E eu falo da Maia para falar de mim mesma. Também eu já tive meus momentos de descontrole e não me orgulho deles. Na verdade, me envergonho por ter dito o que não devia, em momentos em que não devia, da forma que não devia. Mas, por isso mesmo compreendo os momentos de descontrole alheio. Entendo que neles a gente acabe fazendo o que não deve, o que é feio e insensato.





Mas, perder o controle em situação limite e fazer besteira é uma coisa; fazer o feio normalmente, em situações de serenidade, é outra... Observando a diferença entre os dois tipos de situação se pode tirar conclusões e eu não gosto de certas conclusões que me chegam, mas elas gritam pra mim a ponto de eu não poder ignorá-las.





Longe de mim querer fazer julgamentos. Cada um sabe o peso da dor que carrega e eu sei que a vida não é simples... Mas, hoje me pesa o quão injusta eu fui e o tão alto custo do meu descontrole que muito provavelmente não está sendo pago apenas por mim. Não que do fundo do coração eu já não soubesse disso desde sempre. 





Como eu já escrevi antes, erro principalmente quando deixo de prestar atenção aos meus instintos... Também neles, nos instintos, há lados negativos e positivos. Aquela vozinha que sussurra o que a gente deve saber não deve nunca ser ignorada (embora sempre distinguida da mera imaginação). Eu quando não a ignoro a testo, até sem perceber, e o teste nunca, em toda a minha vida, deu negativo. 





Eu nem tinha consciência de que que estava testando alguma coisa. Mas sabia que me coloquei no caminho, a espera, embora não soubesse o que esperava... Acho que esperava o que me limpasse o coração de tanta mágoa. E sei que agora espero outra coisa. Que a vida escreva certo por linhas tortas. E no fundo do coração eu sempre soube que assim é e será.





Depois do choque, a D. Maria, sentida, passou a ignorou a Maia por um ou dois dias. E a bichinha sentiu! Olhava pra mim com cara de “não estou entendendo”... Mas, já estão de boas de novo, pois como diz minha mamãe, “ela foi feita de encomenda”... É! Um anjinho que Deus mandou espalhar alegria nas nossas vidas quando as coisas estavam realmente insuportáveis.







 





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