Há exatamente dois anos, estudando Estética, o professor fazia com que minha turma lesse Antígona, a tragédia Grega. Uma leitura conjunta do tipo jogral. Mas, eu não precisava ler Antígona para saber que estava vivendo uma tragédia pessoal. Vivia o sentimento de que toda a minha vida estava fatidicamente destinada a precipitar-se num abismo, que então se abria à minha frente.
Aprendi muito bem o que é uma tragédia e o que é cair em abismo. Justamente por ter vivenciado tão plenamente é que a situação acadêmica agora se repete. O mesmo professor renovou a sua proposta e, novamente, estou em situação de ler Antígona, a tragédia, com os colegas estudantes.
Nesse meio tempo, o que eu ainda não aprendi é sobreviver a tragédias. Ou melhor, aprendi que a gente não sobrevive. A Helena que lia Antígona há dois anos morreu. Não é a mesma que lê Antígona hoje. E esse novo ser que surgiu, essa nova configuração que eu ainda não conheço, ainda não sabe bem como existir neste tempo confuso. Não sabe, mesmo! Mas, será que alguém realmente sabe?
A gente “sabe” que deve levantar-se da cama todas as manhãs, que deve alimentar-se, trabalhar, estudar, relacionar-se com outros, mover-se em meio ao caos. Quais as condições e possibilidades deste tempo e como se ajustar a elas é um mistério, que as minhas frágeis energias devem enfrentar e não sabem bem como. Do deserto devo fazer um jardim. Como?
Eu não posso dizer que alguma crença se manteve, que alguma fé ainda persiste... Não sei bem dizer o que é essa vozinha, como brisa suave que diz “de algum lugar surgirá algo que fará a diferença”... Talvez eu deva chamá-la de esperança. Não sei ao certo... Como diz a sabedoria popular, a esperança é a última que morre. Parece ser assim, mesmo!
E não sei qual a força misteriosa que articula os caminhos para que a gente sempre acabe encontrando o que nos ajuda a ficar de pé. Sei que desde fins de junho retomei e reconfigurei caminhos que já estavam esquecidos. Neles, inesperadamente, inusitadamente, encontrei o que está fazendo a diferença. Ou talvez seja melhor dizer que fui encontrada. Um turbilhão de significados vem reunindo experiências esparsas vivenciadas em outras vidas, sintetizando novas conclusões. Um compartilhar de experiências parecidas, entre seres parecidos, com histórias semelhantes, que chegam normalmente a conclusões contrárias, de uma contraditoriedade que se complementa em cuidados e risos.
Gatos escaldados não devem esquecer as lições da vida, mas também não devem se tornar paranóicos a ponto de macular o que lhes vem de bom. Também não sei bem o que é esse “bom”, mas não importa. Definir é limitar. Nada de formatos pré-definidos para o que livremente tem ensinado o meu novo “eu” a sorrir. Continuo sabendo que nada sei, mas saí da UTI e releio Antígona com novas perspectivas.