[ Publicado originalmente em 28 de Maio de 2016 ]
Passados alguns dias do afastamento da Presidenta Dilma e mergulhado o país numa onda de retrocesso político misturada com indignação crescente, embora difusa, me pergunto se devo me arrepender da minha escolha de preferir o impeachment.
Preferir, no meu entender, não implica necessariamente fazer campanha para, apoiar golpistas ou não golpistas, participar de panelaço ou de qualquer manifestação coletiva e sim, simplesmente... Preferir! De qualquer forma, ao preferir e ver a minha preferência começar a ser concretizada é preciso ter e manter para mim, muito claramente, quais os motivos da minha preferência. Que não me confundam! São os MEUS motivos, bem fundamentados na realidade que eu percebo, e não os motivos de golpistas (ou não golpistas).
E os meus motivos, já foram deixados claros na minha primeira manifestação a respeito: eu acredito que o governo petista esgotou-se e que as instituições governamentais estão viciadas e falidas; eu acredito na inevitabilidade do ímpeto por mover-se no sentido de satisfazer as necessidades básicas para manutenção das condições de vida, que é característica de todo ser humano. Isso, por consequência, significa acreditar que independentemente de quem esteja titularmente no poder, o povo é manipulável até certo ponto, mas completamente jamais... Significa acreditar que os políticos conservadores, reacionários e corruptos desse país podem dificultar muito as coisas para o povo, mas não ficarão impunes, de um jeito ou de outro... Não há mal que sempre dure. E nos dias que se seguem as coisas acontecem muito rapidamente e nem sempre de forma previsível.
Confesso que as minhas crenças, no entanto, muitas vezes ficam abaladas diante do que eu tenho ouvido e lido na Internet. Frequentemente se diz que a sociedade brasileira está doente. Concordo e me parece inquestionável. A falta de percepção de como os fatos se associam uns aos outros historicamente; a falta de gosto pelo aprendizado e pela pesquisa; o imediatismo e a superficialidade do pensamento; a negação sistemática da realidade; o materialismo egoísta escancarado; os egos exaltados; a falta de cordialidade, de respeito e mesmo de empatia pelo outro; a inabilidade em dialogar e encontrar pontos de acordo possível em direcionamentos opostos; as agressões gratuitas... Tudo isso e muito mais são fatos que me fazem, às vezes, colocar em dúvida as minhas próprias crenças...
Mas, então, eu me pergunto se algum dia, realmente, a humanidade esteve menos doente do que hoje, menos ferida e menos sofrida... Me parece que não. Cada tempo histórico tem suas formas de opressão e, por consequência, seu volume de sofrimentos. O que mudou, também, é que agora tudo, em questão de segundos, está na Internet, para quem quiser ver. As mazelas não ficam mais escondidinhas se fazendo de inexistentes. E os fatos não se mantêm em sua integridade. As percepções que se têm deles são transformadas pelas interpretações, pelos preconceitos, pelas paranoias e histerias.
No momento ainda me parece cedo para responder a minha questão inicial. Devo me arrepender por ter preferido o impeachment? Respondê-la exige que se responda anteriormente uma outra questão: o povo terá força o suficiente para superar a sua própria fragilidade e levar adiante uma reforma política que nos livre desse sistema político viciado e corrupto, colocando o país, definitivamente, no caminho de uma realidade social que se oriente pela ética e pela busca do bem-estar de todos os cidadãos? Cedo para saber ao certo... Mas, eu ainda estou apostando no sim.
Foto (fonte): Blog da Política Brasileira (http://blogdapoliticabrasileira.com.br/).