Nada está mais distante de mim do que o padrão da mulher durona, que não aceita conselhos de ninguém. Pelo contrário, eu os procuro. O jeito tradicional é sentar-me diante de alguém, expor um problema e ouvir um conselho que, talvez, nem influencie nas minhas decisões, mas que certamente agregará perspectivas a serem consideradas.
A Internet coloca isso numa outra dimensão. Por anos fui moderadora e administradora de fóruns particulares do tipo PHP. Aprendi muito sobre mim mesma e sobre a natureza humana observando o comportamento, em ambiente virtual, de uma meninada que não desgrudava do computador e fazia barbaridades. E foi no final desse período, por volta de 2007, quando os fóruns perdiam espaço para o Orkut, que encontrei aquele que desde então é para mim um orientador constante. Paradoxalmente, um publicitário alemão.
Estranho que eu, que tantas vezes expressei meu horror ao marketing e suas práticas, tenha como "guru secreto" um publicitário... Se explica: Trata-se de um "oportunista", no melhor sentido do termo. Alguém que sabe que novas tecnologias geram novas formas de vida e novas possibilidades, vai muito além de repetir chavões decorados das cartilhas de Philip Kloter e de meramente ser suporte de um sistema econômico obscurantista.
Seu filme preferido é Matrix e sua inspiração "Choque do Futuro" de Alvin Toffler. Com ele aprendi a estar de olho no horizonte sem perder de vista o passado, o alicerce. Com 18, 19 anos ele se tornou apoiador da Apple e passou a rodar o mundo fazendo palestras e cursos. Ainda hoje se dedica às tecnologias da informação. Embora eu possa citar seu nome, não quero fazê-lo por motivos que nem eu sei bem... Talvez para não dispersar parte do encanto que o segredo me garante... Sou assim, me encanto com estranhos, com seres distantes, o que não me parece esquisito em filósofos curiosos. O erro, muitas vezes, é querer trazer o distante para perto. Nem todo mundo lida bem com o fato de saber ser importante para alguém.
Hoje ele é um homem discreto. Mas, há não muito tempo não era assim. Chegou a hospedar em rede um volume considerável de fotos pessoais tiradas em seus giros pelo mundo. Também é fotógrafo dos bons! Foi observando seus movimentos que vi um mundo que de outra forma não teria percebido... E não há porque não observar o que outros expõe. E faço isso muitas vezes, observo para aprender... Assim, indiretamente, aconselho-me com quem trilha caminhos diferentes dos meus. No contato com a história de vida de outros, com seus gostos, suas opções é possível aprender muito. Talvez tanto quanto lendo livros. É uma outra forma de leitura.
E hoje acordei pensando no meu "guru" por conta do fantasma de uma descoberta acontecida ontem... Estava eu passeando pelas livrarias de Santo André quando colidi com um título inusitado: "O BlackBerry de Shakespeare"... Embora a maquininha já me pareça ultrapassada, ainda dá para entender sem dificuldades o que o autor quer dizer com esta associação.
E fuça o livro de cá e de lá... Decidi não comprá-lo. Embora o texto tenha me parecido atraente e, inegavelmente, tenha sua utilidade para muitos, me pareceu dispensável empenhar horas na leitura de algo que para mim está óbvio e, inclusive, vem me perturbando imensamente: é preciso tomar decisões quanto ao excesso de informações disponibilizadas pelas tecnologias e procurar viver com qualidade.
Ando me sentindo massacrada pela quantidade de e-books a ler, vídeos a assistir, e-mails a responder... E pior, saturada de tudo acabo não fazendo nada... Cada ferramenta cria uma demanda e trás pessoas com suas expectativas e necessidades a serem atendidas... Isso não é ruim, claro. Mas, o dia continua com apenas 24 horas e cada vez mais eu preciso de sossego e concentração para fazer algo com o que aprendi da vida... Não deixa de ser frustrante me deparar com um "O BlackBerry de Shakespeare: filosofia prática para viver bem na era digital" e me dar conta de que eu bem poderia ter escrito um livro nessa linha [o autor resvala na filosofia, traça paralelos com o pensamento de Platão e outros], pois insights e histórias a contar sobre ambientes virtuais não me faltam. Aliás, não me falta conhecimento sobre várias coisas com as quais eu nada faço, pois permaneço soterrada em informações, cujo volume se torna maior a cada dia.
A Internet, na verdade é como qualquer produto que tem um ciclo de vida, como eletrodomésticos... Depois que passa a novidade (e a vontade de fazer experiências com a nova aquisição) a tendência é que fique restrita ao uso conforme seja necessário... Antes o objeto se acomodando às necessidades da vida do que a vida se moldando pelo uso do objeto... O que prolonga o ciclo de vida da Internet e a mantém sempre em alta são as novas ferramentas que vira e mexe aparecem. Houve o ápice dos fóruns, do ICQ, do MSN, do Fotolog, do Myspace, do Tweeter, do Orkut, agora é o Facebook... E isso não acaba.
Embora eu esteja reduzindo ao mínimo meus rastros pela Internet, o hábito de observar e aprender com outros deve persistir... Mesmo que eu seja uma ilha, dá um certo conforto estar com o binóculo em mãos. Ajuda a não me perder no tempo e no espaço nesta fogo cruzados de dados... O desafio é conseguir manter-se no "caminho do meio", ou seja, sem exagero e com tempo para o que merece tempo.
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